6 ANOS LEVANDO AS NOTÍCIAS DA TERRINHA QUERIDA

AQUI, FÁTIMA NORONHA TRAZ NOTÍCIAS DE SUA PEQUENA BRAZÓPOLIS, CIDADE DO SUL DE MINAS GERAIS.

E-MAIL DE CONTATO: fatinoronha@gmail.com

21 de setembro de 2010

ATEU, GRAÇAS A DEUS! – Renato Lôbo

Arnaldinho, primo-irmão de tio Amarildo, era ateu. Nunca quis saber de religião, mas nunca foi desrespeitoso. Foi batizado, fez a primeira comunhão, casou-se na igreja. Se algo não dava certo não punha a culpa na religião nem em ninguém. Só não havia dado certo, só isso.
Além de ateu, o que já era por demais desmeritoso, se dizia comunista. Cruz-credo! Isso, naquele tempo, era inferno certo! Mas era um comunista diferente, variado e sortido: vivia bem, não perdia nem enterro de anjinho, freqüentava a fina sociedade do Wenceslau, os ternos eram no corte do Curinga, só fumava de piteira, só andava de táxi, só chamava o motorista de chauffeur, e ia à missa. Pois é! Era ateu, comunista e ia à missa. E fazia questão de cumprimentar o Monsenhor:
- A Prática de vossa reverendíssima, hoje, foi direto ao ponto! – Aos mais novos, deixo claro que “Prática”, naquele tempo, era o sermão.
E assim o Arnaldinho se assumia convicto e eclético, jamais, hermético. Não que fizesse a menor idéia do significado disso. Falaram, ele achou bonito e embarcou, só isso. Com ele era assim.
Fino no andar, no comer e no trajar, nunca saía sem meia dúzia de canetas no bolso da camisa: canetas-tinteiro, uma preta, outra azul, lapiseira, e as recém aparecidas esferográficas, verde, vermelha e azul. Parecia condecoração de general. E a idéia era essa. (Comunista e general! Era só o que faltava!) Dessa forma, zanzava por aí: despachado, airoso, solene. Soleníssimo. Atendia ao telefone num “Pronto”, que soava a speaker de rodoviária. Um gentleman, liso que nem quiabo. Quem não conhecesse, comprava na hora. Vivia dizendo que, na vida, era cada um “si por si”. E cerejava o bolo: “Nasci pelado, vou morrer vestido. Já to no lucro”.
Trabalhava. Quero dizer, quase. Pra dizer a verdade, pouco. Ah, vá... nunca! Trabalho pra ele era coisa de escravo. Bon-vivant, fazia tudo o que queria e ainda sobrava tempo. Quem melhor captou e definiu aquela alma foi o Deodato.
- O Arnaldinho tem muita iniciativa, pouca continuativa e nenhuma acabativa.
Tio Amarildo, espartano, exorcizava:
“Uma aberração!”
- Mas ele chega lá. Devagar se vai ao longe! – completava sua senhora.
- Não elogie a égua antes de subir o tope – resmungava o marido.
- Coitado, nunca acertou em nada – e suspirava – mas até casamento não dá certo! Olha pro casamento do Amarildo: cadê que deu certo? – era a alfinetada do dia.
- É um trampolineiro! E vive por aí, naquele farol! – ele voltava ao assunto.
- Pois é, o Amarildo deixou a Miletinha largada, coitada! – ela saía do assunto. Tia Ordália, pirracenta, era mestra em responder ao que ele não havia perguntado. Deixava ele doido. No fim, não agüentava e beliscava:
- E o Arnaldinho, primo de quem será?
- Primo... só primo! – jogou a pá de cal – mas também há outros parentescos... – insinuou tio Amarildo.
É que o Arnaldinho era primo-irmão de tio Amarildo, por parte de pai, e primo ainda que meio longe da tia Ordália, por parte de mãe. Esses eram os “outros parentescos” a que ele aludiu, na volta à vaca fria E deram fim àquela prosa atravessada.
Sabe o que é? Tio Amarildo era um peixe. Tia Ordália, um pássaro. Entendeu?
Dito isso, ele voltou ao livro, e ela vazou pelo vão da porta. Foi medir rua.
- O Amarildo não ta bem, hoje! Precisa de ver! Deve de ser a enxaqueca – foi o que exclamou quando encontrou Chiquita, amiga desde o parto do Dinho.
- Sua alma, sua palma! – profetizou, sisuda e repolhuda, a outra, de ares pra quem a vida só prestava mesmo na hora em que nascia. Depois... báu-báu!.
Cruzaram-se na frente do Bar do Tronco. De dentro, vinha o riso solto do Arnaldinho, num lero-lero que não havia quantia. Perguntaram de não sei quem e ele rosnou:
- Aquilo é o cão chupando manga!
No fundo, era isso aí. Aquele, sim, vivia a vida sem culpa, remorso ou desconsolo: colônia Lancaster, cabelo corte americano, barba aplainada pela arte do Zezinho, um palmo e meio de costeleta, óculos escuros, cerveja numa mão e piteira na outra, camisa engomada, calça tergal de vinco impecável, sapato bico fino duas cores, comunista e ateu... graças a Deus!

Um comentário:

Anônimo disse...

milagre !!!!
ateuuuu
achei q fosse um blog catolico, fala mto de igreja!!!
afff
ta uma delicia o blog!!

Postar um comentário

Obrigada por dar a sua opinião.
Elogie, critique, mas faça isso com educação.
- Comentário com palavras de baixo calão será excluído.